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Pelo canto do olho
de um cão zarolho
aprendi a andar
seguindo o voo das andorinhas
nos ternos labirintos do salalé
que se alimentava da casa vermelha
onde o meu choro primeiro
se mirou nas paredes cobertas
de vários espelhos de cal
2 0 F R A G A T A D E M O R A I S
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Quantos mais dessa rua
entre as ruas da memória esqueceram
a cidade onde ainda as sombras falam
a voz dos reis do Kongo
o longo sono dos escravos
tão longo quanto o vasto mar
de águas escuras
monstros e medos
sem sonhos
mar insano
mar prisioneiro
escoando dos matos e florestas
as lanças das guerras fratricidas
que esventraram o reino
o ébano grito horrendo
dos agrilhoados
do chicote do pombeiro
selva adentro rio abaixo
na boca voraz do jacaré
rio adentro rio abaixo
acorrentados nas velozes
naus de vento em popa
rumo de todas as Américas
sangue africano para a rega
dos milheirais
dos cafezais
dos canaviais
dos vastos campos de algodão
no Mississippi
no Ouro Preto das minas
em que o ouro foi o preto na minas
2 1 B A T U Q U E M U K O N G O