NUNCA PARTAS O QUE EDIFICASTE POR TUAS PRÓPRIAS MÃOS
O
que aqui conto, ouvi. Não sou kota bwelu ou malaiku, uevu? (1)
Ouvi só, não! Também gravei, quando me dirigia
para comprar umas caixas de fósforo no Mamadu (2) ao lado da minha casa, o que
acabei por não fazer pois estes senhores têm a mania de ir rezar a horas nada
cristãs como às três ou quatro da tarde ou algo assim parecido. Enquanto
mentalmente lhe dirigia uns pensamentos pouco agradáveis pois lá se fora o café
que me apetecia beber, a minha atenção foi atraída para a conversa junto a uma
das casas de chapa ao lado de um hiace velho e apodrecido, onde umas galinhas
ciscavam. Escondi-me por rás do mesmo mais ou menos (escritor é mesmo assim,
zongoleiro) (3) e logo após as primeiras palavras decidi gravar a conversa no
meu telemóvel. Aqui vai, sem invencionices:
“Mas
essa onde você stá ir já antão, é melhor qui’eu ?!... Vai antao, mas não vorta
maiji… “
“Não
é isso Mana Maria, ela sómi prometeu maiji qui você mi dá aqui…”
“Ai’ééé?!....
Ti prometeu é o quê?... Eu é qui vou na zunga (4) ti sustento , quem puzeu a
comida em casa, quem é, não su eu qui miti, hum?!” E nomi dela como é antão?
!... Jajuju!... Parece nomi di fábrica, não é nomi di pissoa… CASA CORAÇÃO
CISTERNA?!... Isso é nome di pissoa, ou você está m’inganar?
“Não
minha esposa, é memo nomi dela, casa coração cisterna, ou isterna, ou eu não
precebi bem, e dá matabicho (5) de garfo, não como teu, só pão sem manteca e
chá. Lá ela tá mi dar bifi di bufalu com batata frita di pacoti qu saiu tudo no
kamérica, carni pouco dura, maiji quantidade bwé, (6) com Coca Cola e xuinga.
Esse xuinga que nossos filhos está enganar a fomi, mastiga mastiga, engole
cuspi, engoli cuspi, você pensa stá sair ondi?”
“Bifi
di bufalu é o quê antão. meu marido?”
“Não
sei, ela m’expricou é primo di pacaça (7), antão lhi préguntei porque não dar
já pacaça qui é da terra, tá mandare vir di fora pruquê? Também, pro nossos
filhos ela mi deu uns livros de BD com um pinto grande na capa para colorir,
diz qui si chama banda dessenhada, mas como o pinto era tão feio, dêtê fora.
Não é pruque a genti é pobre que não tem gosto!... Foi nossa primera briga, nos
zangámo prucausa da BD, da banda dessenhada com o pinto feio na capa, vê só
Mana Maria!
“Olha
marido, tu é qui sabes, quer outra mulher só pruqui ti dá carni di primo di
pacaça, vai antão, mas não vorta maji. Aqui tu podi passar mal maji você
conheci e agora zunga stá melhorare e você também já foi pedir teu micro
crédito, montar teu negócio é facil. Está ir estragar tudo prucausa di outra?
Com nome tão difícil, cumé memo, nome esse casa coração de cisterna? Aka?!...
Mi ouvi bem, meu marido, “Yatunda Kilu Kayitombwa.
“Vou pensar Mana Maria, eu nunca comi carni do
kamérica, memo dura e a mana cisterna sempre vai dari alguma água, espero. Já
bebeste água kamericana, já?!...
“Mau
marido, você és maior, vou ti repetir só, “Yatunda Kilu Kayitombwa”.
Aqui
achei por bem sair de fininho, não fosse ser descoberto e louvar o bom do Allah
do Mammadou por tê-lo obrigado a ir render-Lhe a oração das três ou quatro da
tarde, o que me permitiu escrever esta crónica que aqui compartilho convosco.
(1)
Não sou mais velho burro ou maluco, entendem?
(2)
Nome genérico dado aos malianos donos de cantinas, pois a
sua maioria tem esse nome.
(3)
Intriguista
(4)
Vender
(5)
Pequeno almoço
(6)
Muito
(7)
Familiar do búfalo
(8)
O que veio do céu não se desprez
Luanda,
04 / 07 / 12
Sem comentários:
Enviar um comentário