Amanhã, dia 29 de Outurbro corrente, lanço a minha mais recente obra, uma peça de teatro intitulada "A Visita", na União dos Escritores Angolanos, para cuja cerimónia tenho a honra de convidar todos os que me queiram prestigiar com a sua presença.
Eis o que o Professor Jomo Fortunato escreveu, num trabalho publicado no Jornal de Angola.
ESCRITOR FRAGATA
DE MORAIS
Dramaturgo retorna ao texto teatral com “A visita” seu novo livro
Jomo Fortunato
|
Da ficcção narrativa à
teorização do fenómento literário, com um estudo pertinente sobre “O Fantástico na prosa angolana”,
a obra de Fragata de Morais inclui uma das mais importantes investigações no
domínio da história literária, com a “Antologia
panorâmica de textos dramáticos”, um estudo passível de integração nos
conteúdos programáticos de ensino da literatura dramática angolana.
A
dimensão sociológica do conjunto da obra de Fragata de Morais, enquanto
cronista do seu tempo, poeta, e repórter da história, resvala na sátira social,
nostalgia da infância, conflitualidade entre os bons costumes rurais, e a
tentação dos hábitos perniciosos da cidade, tema plasmado no livro “A prece dos
mal amados”, concretizada pela ousadia de uma escrita escorreita e simples, com
sérias preocupações de natureza social e pedagógica.
Simples, e incisivo,
Fragata de Morais explica assim a sua propensão para escrita: “Quando me
perguntam de onde vem a veia para a escrita, geralmente digo que é um dom, que
começou a revelar-se nas redacções que fazia na primária. A partir da segunda
classe, sempre fui o aluno que melhores notas tinha em redacção e leitura. A
escrita fluía naturalmente, claro que condicionada à minha tenra idade e
percepção do mundo que me rodeava, mas a verdade é que fluía”.
Da história mais
recente de Angola, a obra de Fragata de Morais, tem uma palavra de desencanto:
“Há coisas que se passam em Katola que nunca vi em lugar algum. Recordas-te
quando fomos para o Rwanda? De como todos fugiam do país por causa da guerra?
Pois em Inkuna passa-se o contrário, todos fogem por cá por causa da guerra!”,
respondeu Jean Pierre, sem brincar...”, escreve Fragata de Morais no livro,
“Inkuna, minha terra”, uma crítica evidente aos que se benefeciam com a guerra,
relegando para um plano secundário, o sofrimento alheio.
No entanto, a luta pelo
reconhecimento não foi fácil: “Ao longo dos anos, fui escrevinhando coisas que
achava terem uma profundidade e significado enormes, claro que só para mim. Já
mais adulto, lembro-me de ter percorrido todas as editoras de Paris, sempre
tendo o meu material amavelmente rejeitado, por esta ou aquela razão. Não
desisti, e fui conseguindo ser publicado em pequenas crónicas nos jornais da
diáspora portuguesa em Paris. Só na Holanda, em 1971, tive textos meus
publicados em forma de livro, em duas antologias, uma de Poesia, outra de
prosa. Continuei a publicar pequenos trabalhos avulso, lá onde
aceitassem”, lembra Fragata de Morais.
Estreia
É assim que, em 1982,
Fragata de Morais publica o seu primeiro livro, tendo sobre o facto, feito o seguinte depoimento: “Uma
vez regressado a Angola, o falecido Costa Andrade, Ndunduma, surpreendeu-me ao
devolver-me um manuscrito que lhe tinha enviado para Dar-Es-Salam, no início da
década de setenta, para publicação. Claro que, com a Independência, os contos
já não tinham significado, a luta era outra. Finalmente publiquei o meu
primeiro livro, “Como Iam as Velhas Saber Disso?” e até ao presente, mantive
essa linha, a de me preocupar em retratar nos meus livros personagens e vida
rurais, na maior parte, sempre preocupado com a nossa angolanidade, a nossa
natureza, incluindo a urbana. Vejo-me como um escritor com uma raiz forte,
originária do interior onde nasci e vivi a maior parte de minha vida, até aos
anos sessenta”.
Fantástico
Ainda no domínio da
investigação da história literária, “O fantástico na prosa angolana” (2011), de Fragata de Morais, é um estudo singular no seu género: “Quando
me veio a ideia de elaborar a presente antologia, de imediato se me colocou a
grandeza e delicadeza da tarefa, face à vasta gama de escritores nacionais, e
sobre o que eu poderia considerar de imaginário, de fantástico, de real e ou de
irreal, entre muitas outras considerações, numa sociedade em que as fronteiras
entre o mundo visível e aquele invisivel sempre estiveram tão intimamente
ligadas. Face à oralidade das sociedades africanas, da qual Angola não teria
como escapar, este universo de ambiguidade não poderia deixar de ter residência
visível nas diversas obras dos escritores angolanos que, ao longo dos séculos
XIX e XX, foram férteis na produção de textos em que diversos mundos se
interligavam com acontecimentos estranhos, acontecimentos que com muita
frequência fugiam ao entendimento de serem ou não reais face à percepção do
aceitável e ou do credivel”.
Percurso
Filho de Mário Augusto Barbosa de Morais e de Maria
Alice Fragata de Morais, Manuel Augusto Fragata de Morais, nasceu no Uíge, no
dia 16 de Novembro de 1941. Dividido
entre a política e a literatura, Fragata de Morais foi jornalista, actor, dramaturgo,
cineasta, tendo frequentado a Universidade Internacional de Teatro em Paris e a
Academia Holandesa de Cinema. A convite da Academia
de Artes Dramáticas da Holanda escreveu, realizou e encenou os seus trabalhos
de teatro infantil, designado, “Gupia”.
Fragata de Morais apresentou os seus trabalhos no “Holland Festival” e
no “Berlin Kinder Und Jugendtheater”, em 1971. No The Frist Company, seu
próprio grupo teatral, realizou, encenou
e actuou em “The Indian Wants the Bronx” de Israel Horowitz, “Fando e Lis” de
Arrabal, bem como “The Hole”, “Agonies “ e “Sketches”, todos da sua autoria. De
1972 a 1975, frequentou a “Nederlandse Film Akademie”, produzindo para a
televisão holandesa, documentários sobre Angola. Tem pulicação dispersa em
vários jornais e revistas, é cronista do Jornal de Angola, membro da União dos
Jornalistas de Angola, Deputado pela bancada do MPLA, e foi Vice -Ministro da
Educação e Cultura.
Crítica
Sobre “Inkuna-minha terra”
(1997), obra paradigmática de Fragata de Morais, o saudoso escritor, Henrique
Abranches, disse o seguinte: “Esta pequena obra do escritor Fragata de Morais
constitui para mim uma leitura penosa de onde saí deprimido, não porque eu não
conhecesse que a verdade está por trás de muitas das suas estórias, como todos
nós que não andamos a dormir conhecemos tão bem. Mas ele soube ser doloroso por
vezes ousadamente controverso, quase provocatório. A coragem que passa nalguns
dos seus contos, como “Jogo de Xadrez”, ou as “Amizades”, tem traça de um
combatente , de alguém que não quer ser derrotado, porque não acha justo, e
embora não saiba triunfar, soube ver e sofrer com o que viu ( Martinha), é um
bom exemplo, entregando ao leitor a batata quente”...
Obra
Fragata de Morais publicou: “Como iam as velhas
saber disso”, INALD, 1982, “A seiva”, INALD, 1995, “Inkuna, minha terra”, Menção
Honrosa do Prémio Sonangol de Literatura, UEA, 1997, “Jindunguices”, Prémio
Literário Sagrada Esperança, INALD, 1999, “Momento de ilusão”, Campo das
Letras, 2000, “A sonhar se fez verdade”, INALD, 2003, “Antologia panorâmica de
textos dramáticos”, Nzila, 2003, “A prece dos mal amados”, Campo das Letras,
2005, “Sumaúma”, UEA, 2005, “Memórias da Ilha”, Nzila, 2006, “O fantástico na prosa
angolana”, Mayamba, 2011, “Batuque Mukongo”, UEA,2011, e, mais recentemente, "A Visita", UEA, 2014.
Lançamento
“A visita”, teatro, é o
novo livro de Fragata de Morais a ser
lançado no dia 29 de Outubro de 2014, as 18h:00, na União dos Escritores
Angolanos. Em “A visita” o autor conduz o leitor a uma saga amorosa, que
envolve os seguintes personagens: Carla, uma senhora, viúva, da classe média de 45 anos de idade, que
dialoga, de forma mística, com o falecido marido, Tonecas. Dany Boy, também
conhecido por Daniel Bengo, seu nome próprio, o assaltante, com cerca de 35 anos de idade,
“bem aparentado e bem falante, usa bigode, denota estudos e certo berço. Janota,
outra personagem do livro, é filho de
Carla, jovem com cerca de 25 anos. Surgem ainda Lucinda, igulamente da classe média,
conselheira e amiga de Carla, e Sargento Bolingó, um polícia simpático e
cumpridor da lei. O plano da história desdobra-se numa relação amorosa entre
Carla e Dany Boy, viúva e assaltante, respectivamente, sob o olhar do viúvo,
Tonecas, com a cumplicidade de Lucinda e do filho Tonecas. No fundo o livro
acaba por ser uma pertinente reflexão sociológica, sobre os costumes da tradição e os valores, muitas vezes perniciosos, da
modernidade.
Sem comentários:
Enviar um comentário