sexta-feira, 10 de julho de 2009

MANANA DE UANHENGA XITU


MANANA

Agostinho André Mendes de Carvalho, o escritor Uanhenga Xitu, nasceu em Calomboloca, Icolo Bengo, aos 29 de agosto de 1924.

Foi na cadeia, para onde foi desterrado pelo regime colonial português, e onde passou longos anos, que começou a idealizar e escrever os seus contos, certamente como forma de manter a alma alerta, naquele processo da tomada de consciência e da necessidade da sobrevivência intelectual, o que veio a transformá-lo numa das mais reconhecidas vozes da literatura angolana. Certamente numa das principais vozes inovadoras.

“Soube mais tarde” , relata Felito, o artífice da mentira como forma de sobrevivência, “que o nome dessa Manana, não é de origem portuguesa. É do quimbundo. Significa ninfa, ou larva de abelha. Disseram-me que a primeira comida que o avô mandou dar à neta, como haku da geração, foi um bocado de favo de manana. E daqui tomou o nome”.

Uanhenga Xitu, ao edificar Manana com um herói falhado, Felito, e com uma Manana, menina da cidade confrontada com o costume, mais uma vez nos revela a contradição das ligações do campo e da cidade, impregnadas nas vozes e nos gestos dos seus personagens, o drama da aculturação, o caminho da assimilação.

“Responde Manana,” exige Felito, “porque estás metida nestes panos sujos?”

“O que é que tu chamas de panos sujos?... São panos da casa de dilemba. Se eu não fizer este tratamento, quando casar dizem que não faço filhos, e se ficar grávida, ou os filhos saem como malucos ou como abortos. Passo todo o dia neste quarto. Passo a ralar aqueles paus de hula e de kisekua, e depois do pó estar pronto, vêm velhas entendidas nessas coisas e fazem a mistura, com azeite de palma e mais coisas que eu não sei.”

“Tu estás enganada e sugestionada pelos avós. Fazem de ti o que querem e vais aceitando tudo. Mas quando é que uma moça tão esperta, que comungava todas as semanas e menina de bailes, vem cair de um momento para o outro entre bruxas?”

Mas afinal quem são Manana, Felito, avô Mbengo, velha Ximinha e tantos outros? Não respondeu Uanhenga Xitu. Talvez deixando a memória perder-se lentamente na emoção da recordação, do passado imaginado e sentido nas noites escuras de Tarrafal. Mas eu sei, porque já havia respondido há muito.

“As personagens do meu mundo ficcional, a princípio apenas imaginadas, vão-se autocriando, ganham rosto próprio e, mesmo quando lhes dou mais atenção, tornam-se autónomas no interior da minha narrativa, e nem sempre o destino que lhes traçara acabará por se cumprir. Nunca soube, antecipadamente, o fim que cada um teria.”

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